Generalizações têm como objetivo prejudicar a imagem do Judiciário, diz Vanessa Mateus

4 de maio de 2021

O Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, comemorado nesta segunda-feira (3/5), começou com um importante debate promovido numa parceria da Apamagis com o site especializado Consultor Jurídico (Conjur). Sob o tema “Judiciário e Mídia”, o evento virtual foi transmitido simultaneamente pelos canais da Apamagis e do Conjur no Youtube e contou com as presenças da presidente da Apamagis, Vanessa Mateus; do juiz Bruno Miano, diretor Jurídico da Associação; e do jornalista Márcio Chaer, diretor do Conjur.

Durante a live houve o lançamento do Guia Básico Judiciário e Mídia, elaborado pela Apamagis, que pretende propiciar um conhecimento mais aprofundado aos jornalistas, trazendo noções sobre áreas do Direito, os 50 verbetes mais utilizados no ambiente jurídico e, ainda, dicas de expressões comumente usadas pela imprensa e que devem ser evitadas. Foi apresentado ainda um teaser de uma entrevista com o jornalista e professor da Escola de Comunicação e Artes da USP sobre essa iniciativa.

O Guia Básico está sendo lançado num momento em que o Judiciário assumiu um protagonismo em razão de inúmeros conflitos e situações que exigem questionamentos e soluções nas mais diversas áreas, e a disseminação de conhecimento se torna imprescindível.

Para a presidente Vanessa Mateus, como o Judiciário ganhou centralidade no noticiário brasileiro nos últimos anos, seja em razão da política ou de grandes julgamentos, isso fez com que a atuação dos magistrados fosse mais exposta e cobrada pela sociedade. Para ela, no entanto, a grande preocupação agora é com a imagem que vem sendo construída do Poder Judiciário na mídia. “Não há preocupação em noticiar o Poder Judiciário como de fato ele é. Só que temos visto generalizações com o objetivo de prejudicar a imagem do Judiciário.”

Orçamento do TJSP

Vanessa Mateus citou algumas práticas de generalizações equivocadas publicadas pela imprensa e que de tanto serem repetidas acabam tonando-se a verdade dos fatos para quem acompanha o noticiário. O primeiro exemplo a que se referiu foi a divulgação da proposta de orçamento enviada para o Executivo pelo TJSP para 2021, de onde também se originaram investimentos para adequar o sistema presencial para o trabalho remoto, que foi de extrema importância na pandemia. “Precisamos modificar toda a estrutura tecnológica para que, em uma semana, 42 mil servidores e 3 mil magistrados passassem a adotar o teletrabalho. Ainda assim, o orçamento encaminhado foi o menor dos últimos anos. E a mídia começou a falar que o Judiciário pediu um aumento de 100%. Ninguém foi verificar que dos cinco últimos anos este havia sido o menor valor.”

Aposentadoria compulsória

Outro tema muito difundido e muito mal compreendido é a questão da aposentadoria compulsória de juízes. De acordo com Vanessa Mateus, qualquer cidadão que contribuiu com o INSS tem direito a receber o proporcional à contribuição, por mais que tenha cometido algum crime grave e sido preso. Para ela, ao contrário do que se diz, no caso dos juízes a situação é ainda pior. “Um juiz que pratica um delito, é punido inclusive com a perda da aposentadoria de tudo aquilo que ele recolheu. A aposentadoria compulsória não é a punição máxima a um juiz, mas a forma que o tribunal tem de tirar imediatamente do seu quadro alguém que cometeu um ato grave. E ele vai ser aposentado com aquilo que contribuiu até aquela data, não com aposentadoria integral. Agora, quando é condenado, a pena máxima é a demissão com a perda dos vencimentos e da aposentadoria.”

Migração previdenciária

A forma como o assunto aposentadoria é tratado pelos meios de comunicação também recebeu críticas da presidente da Apamagis, uma vez que não há nenhum privilégio em recebê-la integralmente. “Hoje pagamos o que ninguém paga e financiamos as aposentadorias dos demais servidores. A nossa contribuição previdenciária é proporcional ao que recebemos.” 

É por essa razão que os juízes estão pedindo para sair do regime da aposentadoria integral para receber o teto do INSS. Com o intuito de ter esse pleito atendido, a Apamagis, de acordo com a Vanessa Mateus, tem adotado algumas iniciativas: “Encaminhamos um projeto de lei ao Executivo pedindo autorização para que os juízes saiam do regime de aposentadoria integral do Estado de São Paulo, mas a matéria não foi pautada. Nas reformas administrativa e previdenciária, enviamos emendas que não foram aprovadas. Temos um estudo mostrando que a autorização para a migração é vantajosa para o Estado ao longo de 20 anos, e o projeto não é encaminhado. Não se consegue ter uma lei aprovada. Então, como é possível dizer que os juízes têm uma aposentadoria privilegiada, se estão pedindo para mudar de regime previdenciário”, questionou, após lembrar que a Apamagis até entrou com uma ação judicial para obter essa autorização.

Essa exposição negativa e a distorção dos fatos que envolvem o Judiciário têm gerado um outro problema: a evasão de magistrados. Para Vanessa Mateus, a opinião de que juízes responsáveis por irregularidades serão “perdoados” por outros juízes e outros comentários ofensivos desanimam muitos colegas competentes.

“Além desses profissionais estarem se aposentando cedo, alguns estão largando a Magistratura, largando mão do salário. O pior para um juiz é ser visto na imprensa como um marajá, como parte de uma organização criminosa e de um sistema corrupto. Quando o juiz que trabalha, o juiz correto, que é a maioria, se vê retratado como parte de uma organização criminosa, ele não quer mais ficar”, disse a presidente da Apamagis.

Clamor público

O juiz Bruno Miano comparou o trabalho da imprensa com o da Justiça. Para ele, os dois devem prezar sempre pela imparcialidade e jamais cederem ao clamor público. “O clamor público nunca foi bom conselheiro, para a imprensa e para o Judiciário. Cada vez mais faz sentido o conselho de Voltaire, de 1737, aos jornalistas: seja imparcial. O jornalista que for dar uma notícia tem que ser imparcial. Ele não é dono da informação. Ele tem que ser isento, trazer todas as partes envolvidas”, disse, ao destacar que o Judiciário também precisa ser imparcial.

O diretor da Apamagis também falou sobre uma certa ansiedade da imprensa em encontrar respostas, em dar solução aos mais variados casos. E lembrou que o jornalismo e a Justiça possuem tempos diferentes de apuração dos fatos. “No jornalismo, há uma certa ansiedade pelos resultados, se é culpado, quando vai ser preso, quando vai perder os direitos, enfim, querem saber tudo em uma semana. Enquanto no Judiciário o tempo é outro. É o tempo do rito processual. Existem o contraditório, as provas, a depuração, as análises, as alegações finais. Essa fricção que existe entre o jornalismo e o Judiciário, entre o factual e o tempo processual é o que tem causado esse ruído de comunicação.”

Liberdade deslegitimada

Márcio Chaer disse que há hoje no Brasil uma campanha contra a liberdade de expressão por parte de pessoas que dizem defendê-la. Para ele, na medida em que esses formadores de opinião passam a abusar dessa liberdade ao instrumentalizarem ataques ao STF, STJ e à Justiça em geral, a liberdade de imprensa é deslegitimada. “Na mídia há um público muito grande para o entretenimento, para empreendimentos, mas um público pequeno para a informação política, informação econômica, informação cientifica. Então, para aproveitar o espaço da emoção sobre a razão que caracteriza muito a mídia, passou-se a embrulhar a notícia política e jurídica em sentimentos morais, maniqueístas. O uso do conteúdo técnico da maneira novelizada criou o fetiche da corrupção. A fantasia de que todo homem público é corrupto. Isso no fim vira uma campanha contra a liberdade de expressão.”

Parafraseando Pablo Neruda, para quem “todo mundo é livre para fazer suas escolhas, mas vira prisioneiro das consequências”, Márcio Chaer apontou que a imprensa tradicional está encolhendo, infelizmente, e isso pode estar relacionado com as suas escolhas ou com o controle de qualidade que está adotando ultimamente.

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